Hoje fiquei triste às 10h00 da manhã. Fiquei a pensar que já não vou viver tempo suficiente para ver um Portugal moderno, um Portugal com mentalidades um pouquinho mais evoluídas.
Na rádio falava-se do ultimo dia de campanha eleitoral, lavavam-se as cestas da "vindima eleitoral", falava-se em conclusões, balanços, sondagens, barómetros, expectativas, e eis que paro para beber um café.
Entro no café (em Pombal) e na TV está a passar o programa da manhã da TVI com o Manuel Luis Goucha (MLG) e a outra menina loura. No balcão estava uma revista cor de rosa, não sei se era a Maria ou a Ana, mas reparei que na capa, estavam meia duzia de frases sobre a vida pessoal do MLG, Entre as quais, uma frase de que MLG pretendia adoptar uma criança.
Estavamos 3 pessoas no pequeno café. Eu, a empregada (ou proprietária) do café e um senhor que devia ter os seus "late 30 s"
Nisto ouve-se o Goucha a dizer que estava com receio de ter febre e a sua companheira de programa começa a contar a história de que o MLG era um hipocondriaco e a fazer piadas sobre essas suas paranóias de saúde.
O senhor que estava ao balcão comenta entre risos "Deve ter sido o namorado dele que não lhe deu o que ele queria de manhã, de certeza", e a senhora do café riu-se e ripostou que "ele agora até quer adoptar uma criança, veja lá, pelo menos tá ali na revista". Ao que o senhor do balcão responde:
-"Eu não tenho nada contra essas pessoas, desde que não venham ter comigo"- tipico comentário homofóbico. Se alguma vez tiverem uma conversa com um homem que diga isto, é só insistir mais 5 minutos na conversa, que as frases seguintes serão qualquer coisa como "Paneleiro de merda, rabeta do caralho..." e por aí...
E o senhor do balcão continua a atirar pérolas para o ar:
"Conheço uma pessoa - que até é jornalista veja lá (Nota: como se os homossexuais, como doentes que são não pudessem ocupar cargos decentes)- que foi casado e descobriu passados alguns anos que era... assim. E ele tem um filho, que mora com o pai e o namorado. Ao namorado do pai ele chama-lhe «tio Paulo», mas a criança não é burra e já sabe que algo de estranho se passa..."- e continua...- "é como lhe digo, eu não tenho nada contra as opções das pessoas, mas não concordo que possam adoptar crianças, porque a criança cresce naquele ambiente e quando for grande, tem muitos mais possibilidades de ficar como os pais, porque é aquilo que vê em casa!"- falando disto com uma certeza clínica de quem acaba de diagnosticar paneleirice por contágio.
Ora, aqui foi a parte em que eu paguei o café e vim embora de volta para o meu carro, incrédulo, e voltei a ouvir o debate politico da TSF enquanto ao mesmo tempo que pensava que realmente em Portugal coabitam vários mundos diferentes e eu até tenho a felicidade de provar de alguns (tão opostos), ao contrário de alguns amigos que tenho que só conhecem o mundo da malta "fixe", dos artistas, da intelectualidade, e até da "faculdade", esquecendo que a grande maioria das pessoas vive outras vidas, a outros ritmos, com outros interesses e perspectivas. Ah, e como eu adoro essa diferença!
Pensei que devia ter perguntado ao senhor do balcão se preferia que as crianças não fossem adoptadas e crescessem sem amor, ou se preferia uma criança criada num seio familiar heterossexual violento ou que haja um caso de miséria, fome, alcoolismo, droga, ou prostituição?
E isso, senhor do balcão, será que se pega?